11 de jul. de 2010

Zico - Segunda Parte


"E agora como é que eu fico, nas tardes de domingo, sem Zico no Maracanã"? Moraes Moreira era peladeiro nos tempos dos Novos Baianos. Mas certamente jamais acertou na veia tanto como na frase da música em que pretendeu passar o sentimento do dia em que Zico parou. Legiões e legiões, e não só de rubro-negros sentiram o mesmo. Ver Zico jogar era uma visão. O futebol já havia começado sua transição para o futebol-força da atualidade. E por muito tempo, o maior antídoto contra os céticos que adoravam repetir que o "bom era aquele futebol lá dos anos...", foi Zico. Lançamentos, enfiadas milimétricas de bola entre defesas atônitas, o lance que ninguém pressentiu pensado em dois segundos, arrancadas geniais com a bola deixando um por um dos adversários para trás...Por tudo isso, muita gente ainda se pergunta, tanto tempo depois: "E agora como é que eu fico, nas tardes de domingo, sem Zico no Maracanã"?
Lúcio Castro, ESPN

Nesta segunda parte da entrevista com o maior craque da história do Flamengo, inserimos também algumas matérias antigas sobre a vida do Zico. Para ler melhor alguma delas, basta clicar sobre a imagem. Confiram!


1) Na entrevista com Tita, falamos sobre o pênalti que ele perdeu em 1977. E ele acredita que aquele foi o momento em que o time campeão do Flamengo a partir de 1978 amadureceu, cresceu. Você também acredita nisso?

Zico: Foi, também acredito. O Tita entrou justamente para bater aquele pênalti, quer dizer, ele entrou no final da prorrogação justamente para bater o pênalti. Coitado, ele foi o único que perdeu. E era um jovem, era um moleque que estava começando. Quando acabou o jogo, no ônibus, reunimos todos os jogadores, o Coutinho, fomos para aquele restaurante Barril, ali no Arpoador, final de Ipanema. Choveram críticas porque parecia que nós estávamos comemorando. Nós havíamos perdido e ali “fechamos” o nosso pacto de muita solidariedade a ele, ao próprio Tita. E o que aconteceu com a gente em 77? A coisa reverteu! A partir de 78 virou tudo, porque em 78 aconteceu justamente o contrário. Ganhamos do Vasco. Se a gente ganha e o Tita faz aquele gol, nós não seríamos campeões. A gente ganharia o segundo turno para disputar com o Vasco. Então, o Vasco ganhou, ganhou direto. Em 78, aconteceu o contrário.

2) O detalhe mais interessante do gol do Rondinelli é que você não batia escanteio.

Zico: Não, raramente.

3) Chegando a 78. Queríamos falar de um episódio que apareceu um pouco na ESPN, que está reprisando os jogos. Você, de novo, com a camisa da Seleção. Você com a camisa 8. A Seleção teve uma pré-temporada sensacional. O Coutinho colocou o Edinho de lateral esquerda. Tinha um meio de campo muito forte. Tinha você, tinha o Rivelino, tinha o Reinaldo na frente. Aí, o Brasil na COPA de 78 tem aquela fase inicial não muito boa, tem aquele gol seu anulado com a bola batida no escanteio e o time muda, por uma imposição do Heleno Nunes, todo mundo diz isso.

Zico: Foi coincidência, não é?

4) É, foi uma coincidência terrível. Ele (Heleno) chega e fala: “Eu quero o Jorge Mendonça, eu quero o Roberto Dinamite e...”

Zico: E Rodrigues Neto.

5) O Coutinho comentou alguma coisa com você? Porque ele era o técnico do Flamengo também. Como é que foi isso, ser barrado assim, dessa forma? E você sentir que há alguma coisa externa...

Zico: O Coutinho, chamou nós três: eu, Edinho e Reinaldo. Aí explicou uma série de motivos e principalmente para mim e para o Reinaldo. Era o problema do campo, que o campo lá era muito pesado. Para o Edinho, ele explicou que ele tentou uma situação e que não deu certo e que ele agora ia voltar com um verdadeiro lateral e que ia botar o Rodrigues... E disse que já pensava nisso e que o presidente antecipou uma conversa que ele tinha falado para imprensa. Explicou aquelas coisas todas.

Aí tá bom. Fomos sair e eu, por esse relacionamento que eu tinha com ele, voltei e falei: “Coutinho, eu posso conversar com você?” Ele respondeu: “Pode”. Eu falei: “Tudo bem, eu aceito todo este tipo de explicação que você quer dar. Você tem todo o direito, acho que você não tinha nem essa necessidade de dar essa satisfação para nós. Direito seu de escalar quem você quiser. Você pode fazer. Só quero que entenda uma coisa, achando certo ou não achando certo, pode contar comigo. Eu tô aqui, vou continuar trabalhando para recuperar minha posição, vou continuar lá firme. Não é porque você trabalha comigo no Flamengo que você pode ficar assim, de achar que eu vou ficar “p... da vida”, vou fazer alguma coisa. Sou convocado da Seleção para estar bem, e na hora em que você precisar, pode me chamar. A minha palavra serve? Não sou de acordo com nada disso. Minha opinião é a de que não tem nada a ver esse negócio de campo, esse negócio e tal. Aceito as suas explicações, não vou questionar nada. Vou lá treinar para cacete porque a hora que você precisar, eu to aí. Pode contar comigo.”

E assim foi, continuei treinando. Só achei errado dele, na véspera do jogo da Polônia, sabendo que eu ia jogar não me ter avisado. Porque quando “os caras”, que não vão jogar, normalmente treinam mais. E eu, treinava sempre mais depois. Acabava o treino e eu continuava treinando. Treinei a mais, me desgastei a mais, porque a tendência era eu entrar faltando meia hora. Eu treinei mais na véspera. Quando chegou de manhã, o massagista foi lá falar comigo. Massagista, roupeiro, esse pessoal sabe tudo, cara, impressionante. O João Carlos era do Flamengo, ele virou e falou assim: “Se prepara que você vai jogar esse jogo”. Falei assim: “Eu vou jogar?” Então, já foi chato saber isso pelo roupeiro. Quando chegou na hora da preleção, ele me botou para jogar. Eu, com menos de 1 minuto, eu tive uma distensão. Fui cruzar e o cara travou! O músculo da perna estourou todo, além disso machuquei o meu tornozelo... Foi uma entorse do tornozelo.

6) Final do Mundial, em 81. Você ganha o prêmio de melhor em campo, você ganha um Toyota. Você ainda tem esse Toyota?

Zico: Tenho, tá lá em casa. Tá difícil de andar. Naquele ano foram dois prêmios, dois carros. Ganhamos eu e Nunes. A gente já tinha definido que o dinheiro do carro iria ser rateado por todos da Comissão Técnica. A minha ideia era ficar com o carro de lembrança. Além disso, naquela época não se podia trazer carro para o Brasil e, com isso, não tinha sentido ter o carro. Em termos de prêmio, o meu carro custava U$8.000,00 e o do Nunes, custava U$7.000,00. Você vê o valor que era da época. E o nosso do prêmio, do campeonato, foi de U$5.000,00. Então, a gente fez um acordo com a Toyota. Estávamos começando aquela fase de abertura para importação. A Toyota dava os dois carros com a ideia de alguém trazê-lo para cá, porque para ela era importante, né? Um cara andar aqui com um carro importado seria uma propaganda enorme para a Toyota, já que um ano depois as importações iriam abrir. Decidimos levar os dois. Dividi os U$8.000,00 pelos jogadores e o Nunes fez a mesma coisa.

7) E você acha que isso foi muito importante para grupo?

Zico: Foi, lógico.

8) Na medida em que você, como craque, está ali, na divisão.

Zico: É, a gente sabia que a possibilidade de eu ganhar era muito grande, naquele período. Um ia ganhar. Maior probabilidade, principalmente, por causa do nome. A Toyota queria é isso.

9) Claro, o ídolo.

Zico: Botar o ídolo com um Toyota, passeando com o carro. Bastava eu jogar mais ou menos que a possibilidade de eu ganhar era maior que a dos outros.

10) Vamos para o Campeonato Brasileiro de 1983. Neste ano você jogou machucado na final contra o Santos. Que contusão você teve?

Zico: Eu estava com um problema muscular e aí eu segurei um pouco durante os treinos da semana para não agravar. Praticamente, fiz todo o trabalho, mas de maneira leve. Não era uma coisa preocupante, o que me preocupava ali é que eu já estava vendido.

11) Na imprensa, saiu que a sua venda foi feita um mês antes. Procede isso?

Zico: Procede. E, ela só não foi concretizada ali naquele momento porque deu um problema na Itália, mas eu já estava vendido.

12) E quem sabia isso? Eram você e os dirigentes?

Zico: Todos os dirigentes, não. O presidente.

13) Na época era o Antônio Augusto Dunshee de Abranches?

Zico Era o Dunshee.

14) Ele foi execrado e depois renunciou.

Zico: Era eu, ele, o meu procurador, o meu irmão, que pela primeira vez participou disso. O João Batista, meu primo, fez questão de que o meu irmão Antunes, já falecido, participasse. Tivemos um encontro ali, num motel perto do Aeroporto Santos Dumont. Eu já tinha tudo acertado. O pessoal do Udinese acertou tudo comigo. Já estava vendido ali.

15) E o grupo não sabia? Os jogadores não sabiam?

Zico: Os jogadores não tinham conhecimento disso. Ninguém sabia. Neste ponto, o pessoal do Flamengo, se manteve discreto. E isso ocorreu pelo fato de o Flamengo estar decidindo o Campeonato. Por estarmos na decisão, se vaza alguma coisa ali, a situação poderia ser ruim para todo mundo. Ia tirar o foco. Imagina eu, principal jogador, na final, estar vendido.

16) Vamos para o Campeonato de 87. Vimos a sua entrevista no SporTV falando do título de 87, da polêmica e tudo mais e você também estava machucado, não é?

Zico: Não, não. O que eu fiz um esforço maior mesmo. Foi ruim em 1980. Em 80 é que eu me machuquei mesmo. Eu tive uma contratura no segundo jogo contra o Curitiba (semi-final). O início de uma distensão. O médico me disse: “Tua musculatura tá prestes a estourar...”

17) E aí você não sabe quanto você pode "se soltar" em termos de desenvoltura, não é?

Zico: Exatamente. Você fica impedido, porque dá um “bolo” no músculo quando você vai correr ou chutar. Estava treinando e senti esse “bolo”, uma câimbra. Fiz o movimento e, no momento em que eu levantei o pé, já senti. Parei na mesma hora. Não deu nenhum estiramento, nada. Foi só um aviso que eu poderia ter algo no músculo, algo que estava no início. Nós tínhamos um jogo com o Atlético Mineiro, na quarta e domingo, a final. Já cheguei para casa de repouso. Fiquei em casa repousando. Segunda, terça, quarta. Eu nem levantava. Só levantava para fazer “xixi”. Comia deitado, vi o jogo todo deitado. O Flamengo perdeu em Belo Horizonte. Quinta-feira a mesma coisa. Quando chegou na sexta-feira é que eu levantei para ir ao Flamengo. Fui lá, fiz umas voltinhas no campo. No sábado participei um pouco de leve e fui para o jogo muito preocupado, mas correu tudo bem. Estava sem dor nenhuma.
A dor de 83 foi mais, acredito, problema de tensão. Desgaste, aquela coisa... Desgastante para mim, por saber que podia ser o último jogo com o Flamengo por já estar com tudo acertado e por ser a final. A gente tinha perdido de 2 x 1 lá em São Paulo, tinha que ganhar de todo jeito. Se fosse 1 x 0 ia para os pênaltis; 2 x 0, a gente liquidava; então, aquela partida se mostrava complicada.
O de 87 não, o de 87 eu estava machucado. Eu estava com o joelho tendo que operar... Eu tinha que operar. Em um jogo do Brasileiro, no gol que fiz contra o Santa Cruz, o terceiro de falta, fui comemorar e eu tinha sido operado, tinham sido feitos pontos aqui no meu joelho. O que aconteceu? O meu menisco suturou, então, eu não podia saltar. Eu me policiava de tudo que é maneira. Comemorar gol, eu só corria. Não podia apoiar todo o corpo em cima porque a possibilidade de o ponto arrebentar era muito grande. Então, quando eu fiz aquele terceiro gol, a vibração, a emoção por ter sido um lindo gol, fui saltar, abraçar lá o Zé Carlos, que já faleceu, eu caí e a “p...” do joelho doeu. O ponto arrebentou. Eu joguei os dois jogos contra o Atlético MG, depois os dois jogos contra o Internacional com problemas. Acabava o primeiro tempo, o joelho inchava, eu botava gelo, voltava para o segundo tempo, mas não agüentava, aí saía. No dia seguinte do último jogo do Internacional, fui direto lá para o Dr. Neylor Lasmar operar o joelho.


18) Zico, você jogou na Itália e pesquisando toda a sua vida, você teve problema com o fisco, não é? Por que você acha que a imprensa não o divulgou? Esta sua declaração foi muito pouco trabalhada aqui. Só foi trabalhado o lado negativo, ou seja, quando você estava com o problema na Receita Federal?


Zico: Mas isso acontece até hoje. Quando eu fui condenado, a manchete deu no Jornal Nacional. Quando você é absolvido, tem uma linhazinha. Isso é normal de quem dá a notícia. Isso não adianta, a gente é que, quando tem a oportunidade, tem sempre que estar lembrando essas coisas. Hoje, o que está vendendo, principalmente, são as coisas ruins.

Se você tem dez coisas boas, uma é ruim, a ruim é a que tem maior destaque. Eu me lembro na “Gazeta de L’ Sport” quando saiu: “Zico e Galera” deste tamanho! Então, quando eu fui absolvido, saiu uma linha. Aquilo foi muito fácil de resolver, porque o contrato foi até assinado aqui no Brasil, numa data inesquecível porque era 10 de junho, aniversário do meu pai. Quando eu assinei o contrato de imagem eu tinha satisfações a dar ao fisco brasileiro porque a minha imagem era do Brasil, só que o presidente da Udinese acertou na Itália de utilizar um contratinho de publicidade, ele tinha que me alertar. Bastava pedir uma autorização, e a Udinese, que estava enrolada, acabou não pedindo autorização e aí quando fui fechar o meu contrato na Itália vi um parágrafo novo. Eles fizeram uma cláusula dizendo que, para eu poder assinar o contrato de novo, se eu morresse, o contrato estaria rescindido. Então, eu liguei para meu advogado aqui e ele disse: “Não, pode assinar, não tem problema”

Só que aqui, pelas leis, eu já estava como residente na Itália e, como residente na Itália, este contrato prevalecendo, eu tinha que pedir autorização para fazer o contrato de publicidade. E a Udinese me ludibriou nesse ponto. E aí, não adianta. É falta de conhecimento. Aconteceu que os caras foram e disseram: “Tu tá morando aqui, não tem nada nesse contrato e tal”. E eu paguei em Udine. O meu contrato na época, foi de U$ 2.100.000,00 por 3 anos, eu paguei uns U$ 450.000,00, quase U$ 500.000,00 de imposto, para deixar lá. Então, o contrato de publicidade era daqui e eu ainda tinha que pagar lá. E eles tinham razão porque pelo que o cara fez, eu tinha mesmo, pela lei italiana. O presidente viu isso. Eu recebi a intimação após ter ido na casa do presidente da Udinese para ver um negócio do Flamengo. Voltei para casa, andei 2 horas de carro, cheguei em casa, tinha a intimação. Peguei o carro e voltei de novo na casa do presidente. Eu andei 8 horas de carro naquele dia. Eu cheguei em Udine. Quando cheguei, a Sandra: “Tem uma intimação aqui”. Naquela época, não tinha essas comunicações todas. Então, voltei. Peguei o carro e voltei de novo na casa do presidente. Eu andei 8 horas de carro naquele dia. Voltei lá para conversar com ele.

O que me surpreendeu é que quando eu cheguei lá, ele falou assim: “É, eu já sabia que isto podia acontecer” Eu falei: ”Como o senhor já sabia?” Então ele balançou e disse que era porque estava sendo revistado tudo lá na Udinese. Então, eu tinha três dias para constituir um advogado. Como é que eu ia achar algum advogado? Tinham que me sustentar no clube, me dar apoio no clube. Eu não conhecia tanta gente lá. Eu peguei o advogado do clube. O cara era advogado do presidente. E me disse para eu não apresentar o contrato, só se houvesse julgamento. E o procurador, que tava me atacando, quando eu fui lá, disse: “Por que você não me apresentou isto?" Eu falei: “Por que o meu advogado falou...” Ele interrompeu: “Eu já sei, advogado do presidente, ele tá salvando ele e te ferrou”. O cara mesmo que era o procurador e que me atacou de tudo que é maneira. E aí eu tive que ir para julgamento. Fui condenado e peguei outro advogado, de outra cidade e eu levei de 3 a 4 anos para conseguir a absolvição.

19) E trabalhando com isso, desgasta né?

Zico: Isso aí eu tava jogando, mas eu já tinha vindo embora. E o que aconteceu? Tinha a seleção, e os caras não queriam deixar eu sair. Então me ligaram e me convocaram. Eu fui lá na Procuradoria e falei: ”Meu passaporte está aqui, estou convocado para Seleção, eu vou servir o Brasil, e fica a seu critério o senhor me liberar ou não. Não estou fugindo daqui, não tem nada”. Então ele falou: “Tá bom, você pode ir.” Eu disse: “Eu vou até o final para isso, pois não quero de forma alguma sujar o meu nome, o senhor já sabe, tem o meu contrato aí. Vou brigar por isso.”

Bem, o que aconteceu é que um amigo meu que foi lá para casa na sexta-feira, a Sandra já tinha vindo embora, aprontei minhas coisas, era só de roupa mesmo e, ele levou o caminhão lá, ficou na garagem. Segunda-feira, eu fui para Veneza e nunca mais voltei nessa casa. Ainda falei com presidente: ”Ou o senhor me vende para o Flamengo de volta ou então eu vou parar de jogar futebol. O prejuízo vai ser seu”, porque eu nunca mais ia lá mesmo não. Eu vim embora.

20) E sobre a Seleção de 86. O Leandro e o Renato foram cortados e a imprensa dizia que tinha mais jogadores envolvidos, o que a gente quer saber é: como o grupo absolveu aqueles cortes? O grupo apoiou ou não decisão do Telê?

Zico: O cortado foi o Renato, o Leandro foi solidário. A questão da saída, também tinha outros jogadores, mas o problema do corte do Renato não foi em função disso. O Telê brigava muito com o Renato, aquela coisa do jeito dele de ser, de jogar e o Telê pedia e eles discutiam muito dentro de campo. O Telê queria que ele jogasse de uma forma e ele queria jogar de outra. Acho que, pelo que eu conhecia do Telê, por mais que ele não gostasse do que aconteceu nesse episódio, ele sabia que aqueles jogadores que estavam ali, a grande maioria, faziam tudo por ele. Então, eu acho que o corte do Renato foi em função da relação dos dois na parte do campo.


21) Mas então por que o Leandro não percebeu isso?


Zico: Não sei, naquele período foi muito difícil falar com ele. A gente tentou, eu e o Júnior voltamos para pegar ele, na casa dele e ele não quis. Foi desgastante. É o tal negócio, é a minha opinião. Pode ser que o Leandro até hoje ache que foi por causa daquilo.


22) O grupo não viu o Renato como um injustiçado? Ou seja, o grupo não viu o Renato como alguém que tinha um problema com o Telê dentro de campo?


Zico: Eu vi dessa maneira e falei para o próprio Renato, algumas vezes. No dia do problema da fuga da concentração, nós fomos falar com o Telê e tal. O Renato voltou e continuou com o grupo. Não foi ali que ele foi cortado. O Renato foi cortado depois, na relação final da Copa. Quando fomos para Copa, o Renato foi cortado e aí todo mundo achava que o Renato tinha sido cortado por casa daquilo. Essa interpretação foi feita depois dos acontecimentos.

23) Como foi o Zico na “Era Collor”, no governo Collor?

Zico: Tranquilo, tranquilo, principalmente porque eu tive toda a liberdade, ninguém interferiu em nada, no meu trabalho, na minha Secretaria. Foi uma Secretaria nova que nós montamos, outra cabeça. Procuramos fazer aquilo que estava dentro do planejado e era possível. Ela era ligada ao MEC, ou seja, estava preso ao Ministério da Educação. Quando o Collor colocou a Secretaria ligada direto à Presidência da República, nós, lógico, pegamos algumas pessoas lá, uns servidores da área, que já estavam lá, mas a gente construiu uma nova Secretaria, uma nova mentalidade, nova posição e fizemos o trabalho dentro daquele cronograma que foi traçado pela Presidência. Agora, fizemos dentro daquilo que nós colocamos. O que é preciso, o que é necessário. Tudo o que a gente ia falar nas audiências era dito: "Ah! Tá bom!" Apresentamos modificação de Projeto de Lei e foi o que realmente aconteceu. Quando nós discutimos um Projeto e o Collor disse: ”Ah! Tá tudo bem, este tempo todo, a única área que entregou um projeto dentro daquilo que a gente quer, de mudança e tal, foram vocês...” Discutiram quase duas horas com a gente. Saímos de lá e quando ele olhou bem aquilo, aquilo afetava os caciques dele lá do Nordeste, principalmente as Federações. Então, ele ficou numa banana. ”O que é que eu vou fazer?” E aí começou a desistir de querer que a gente discutisse com a Assessoria da Presidência. E foi aí que eu me desliguei. Eu fiz uma carta de demissão, até ele me dar uma audiência, porque ele não queria dar mais audiência para mim. Eu falei: “Quando você puder me dar uma audiência...”. Fizemos uma carta, só eu e o Antônio sabíamos, entreguei para ele. Ele falou: “Você me dá um tempo para eu encaminhar este Projeto”. Ele encaminhou ao Congresso. Ele disse que eu não sairia dali sem que ele encaminhasse o Projeto. Encaminhamos e no dia seguinte que encaminhamos o Projeto, ele anunciou outro nome.

24) Zico, para finalizar, eu gostaria de saber sobre a sua carreira de Treinador. Você ficou muito decepcionado, principalmente com o tratamento que foi dado na Grécia. E a Imprensa diz que você recebeu sondagens e que você recebeu uma proposta da Juventus. Seu nome surgiu na Juventus, você não recebeu nada?

Zico: Não. Hoje é muito difícil saber com quem você está falando. Tem muita gente trabalhando. Você não sabe quem é quem. Os clubes não te procuram diretamente hoje. Tem sempre intermediário. Então tem aí, umas quatro pessoas falando em nome do clube. Quatro já me ofereceram uma Seleção, cinco me ofereceram na Arábia, seis já me ofereceram nos Emirados, você não sabe. Tem uma pessoa cuidando na Europa e outra aqui. É preocupante isso, né? Não existe mais aquela coisa direta, do cara da Juventus chegar aqui e perguntar: “Tu quer ser treinador da Juventus?” Eu não sei porque não acontece isso, porque tem que ter intermediário pra tudo.

25) E o que você quer fazer no futuro? Você quer continuar como treinador ou....

Zico: Se for uma coisa muito boa, eu vou, eu continuo. Eu estou vendo umas coisas para ficar por aqui. Umas novidades. Um novo caminho. Pode ser que eu fique.

26): Nós gostaríamos de te agradecer pela entrevista e a gente lá, no blogue, coloca uma partida inesquecível dos entrevistados. Que partida inesquecível você gostaria de deixar registrada?

Zico: Flamengo e Cobreloa